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quinta-feira, 26 de maio de 2011

Lei 10.639/03:arte e cultura de matriz africana e os professores

Quase 13 anos após o sancionamento da Lei 10.639/03 (Obrigatoriedade do ensino da História das Culturas Africanas e Afro-Brasileira), me surpreende como ainda há profissionais que atuam na área da educação que não possuem informações e formações adequadas e básicas à efetivação da mesma.
Não tivemos significativos avanços no que se refere à oferta bibligráfica e mesmo considerando os títulos disponíveis no mercado, podemos dizer que alguns possuem conteúdos bem duvidosos no que se refere à qualidade das pesquisas transformadas em texto para docentes ou estudantes.
 O que me deixa realmente mais tranquila é o fato de que muitas Secretarias de Educação Municipais e Estaduais têm em seus quadros de funcionários supervisores e coordenadores realmente comprometidos com a efetivação da lei e que compreendem e valorizam esta conquista. Sim, mesmo sendo à força (forca!) a lei é uma conquista e garantia de que meus filhos, se porventura os tiver, terão acesso a um conhecimento sobre meus antepassados que eu não tive.
Certamente, em vez de sair da aula de história que aborda o tema da escravidão se sentido humilhados por terem seus antepassados escravizados e chicoteados e serem ESTAS as imagens (Rugendas e Debret) que ainda são enfatizadas por muitos docentes, eles saberão também o quanto foi fundamental para o desenvolvimento de nosso país o conhecimento metalúrgico, agropecuário, enfim, tecnológico trazido pelos nossos pretos e pretas velhos. Ao serem chacoteados por seus colegas, geralmente brancos e, em muitos casos mestços que não sabem negros, no momento do "recreio" terão condições de elaborar respostas pautadas em dados históricos. Isso se eu for mãe e conseguir fazer com que meus filhos sejam crianças que não tenham dificuldades para se expressar publicamente.

Para além dos conhecimentos, tem um lado desta história que têm sido pouco explorado e que é tão importante quando o assuntos que serão ensinados: educar para a diversidade tanto os alunos quanto os docentes. A quantidade de docentes que são racistas, discriminadores e preconceituosos e que não reconhecem em suas atitudes tais práticas é absurda! Racismo, discriminação e preconceito não se manifestam e se praticam somente por meio de atos de privação e violência física como as cenas que anos atrás víamos na televisão relacionadas à África do Sul. Há comentários, aparentemente inofensivos para as concepções de alguns adultos, por vezes, educadores, que são devastadores na constituição da personalidade e da auto-estima positiva de crianças negras. Só o elogio feito freuqnetemente às crianças brancas na frente das crianças negras já é uma marca difícil de se apagar: "por que não sou elogiada nunca?". Nós mulheres quando o namorado comenta que outra mulher é bonita já nos tornamos umas bruxas. Imagem, então, uma criança. Fora do ambiente da minha casa junto dos meus parentes, de minha mãezinha e paizinho que tanto cuidaram da gente, eu não era lindinha, fofa, o tempo todo. Percebia certa diferenciação até ter uma professora negra (que se sabia negra), na quarta série: Neusa. E na quinta série a Rosangela, mestiça e consciente de toda essa problemática, que muito me elogiava em  uitos sentidos. Sabia reconhecer qualidades mais impacialmente. Quando me tornei adulta e me descobri bela, à princípio achava que era, mais uma vez, tiração de sarro, sério, viu, gente?
 Esta parte também deve ser trabalhada urgentemente. Expressões e palavras como "de cor", "cabelo bom, cabelo ruim", "escurinho", dentre outras usadas para se referir eufemisticamente ou nnegativamente à aparência de crianças negras devem ser banidas do vocabulário escolar. Bem como os professores devem intervir de forma crítica e assertiva no caso de "brincadeiras" que se estendem no ambiente escolar: "filhote de urubu", "neguinha macumbeira", "tição". Quem não conhece, adora, ri e reconhece situações vividas em ambiente escolar que se assemelham a estas quando assiste "Todo mundo Odeia o Chris"? Hoje é engraçado, porém é a história de um homem negro, hoje ator e comediante, que sofria com o ruivinho Caruso e com a atuação preconceituosa da professora Srta. Morello (que se parece com muita gente por aí).

Não precisamos de mais Srtas. Morello por aí lecionando para as nossas crianças negras e brancas, fazendo diferenciações e tirando conclusões a partir de seus próprios preconceitos. "Todo mundo adora o Chris"!
Então, meu povo, o trabalho é grande! Só nesta semana ministrei dois cursos com oficinas. Um promovido pelo engajado Allan (é uma) da Rosa (Edições Toró) e outro pelo SESC Sorocaba em parceria com a Secretaria de Educação da mesma cidade. Que lindo o brilho nos olhares dos participantes que queriam aprender para que se tornassem melhores educadores, para professar informações consistentes junto aos seus pupilos.






Dia 21 de maio de 2011: "Teias das expressão, Chamas da reflexão", Palestra com oficina sobre arte feita por artistas afrodescendentes brasileiros e norte-americanos. Organização das Edições Toró (Allan da Rosa) em parceria com SMC. Iniciativa de qualidade, apoiada e feita banhada em sangue, suor e socialização de informação e conhecimento. Também ministraram aulas Marcelo de Salete (artista plástico, quadrinista e pesquisador) e Luciane Ramos (pesquisadora, antropóloga e bailarina).







Dia 24 de maio de 2011: Abertura do ciclo de seminário para formação de coordenadores de escolas da rede pública estadual de Sorocaba "A África Também Está Aqui", promovido pelo SESC e pela Secretaria de Educação de Sorocaba, com 130 presentes!!. Tive que ler um trecho de "Quarto de Despejo", de Carolina Maria de Jesus no final:"O branco é que diz que é superior. Mas que superioridade apresenta o branco? Se o negro bebe pinga, o branco bebe. A enfermidade que atinge o preto, atinge o branco. Se o branco sente fome, o negro sente. A natureza não seleciona ninguém". Eita, que mulher inteligente! 
Como muita gente me escreve via Facebook e email solicitando HELP, escrevo este texto e desabafo já com algumas indicações de livros que podem ser lidos para formação docente e também para desenvolvimento de propostas junto à criançada.
Mais adiante socializarei atividades que desenvolvi tanto enquanto trabalhei como educadora, consultora e coordenadora no Núcleo de Educação do Museu Afro Brasil quanto as que elaborei posteriormente, agora como profissional independente e ligada ao Instituto Sidarta. Diga-se de passagem, que o Museu Afro Brasil com toda a sua potencialidade, mesmo sendo, primeiramente, um espaço para salvaguardar a produção artística e cultural afrodescendente, deveria ter em sua gênese este papel de ser um espaço formador e conscientizador de professores. Porém, não como uma ação pontual como já ocorreu em alguns momentos, mas sim como um programa constante porque é para esta instituição que muitos professores e educadores se dirigem quando possuem dúvidas. Deveriam abraçar com carinho estas causas inerentes à sua existência e não se trata de desvirtuar a sua atuação, afinal de contas, o Museu Arte de São Paulo oferece curso de História da Arte, ainda que pago, faz tempo... Gente, please, chega de arte-educação: ARTE É EDUCAÇÃO!



O Museu Afro Brasil tem potencialidades para promover um curso contínuo voltado à formação docente focada na Lei 10.639/03. Por que não o faz?
Este texto também é para comemorar nossos
3.000 acessos desde fevereiro!

Livros fundamentais para se pensar no planejamento com assuntos relacionados à Lei 10.639/03:

Livros indicados para formação/ ampliação de repertório docente:


AGOSTINHO NETO. Sagrada esperança. Luanda: Edições Maianga, 2004.
BARBIERI, Renato. Na rota dos orixás (fita de vídeo - VHS). Aspectos da Cultura Brasileira. São Paulo: Idealização e Realização Instituto Itaú Cultural, 1998.
CAROSO,Carlos & BACELAR, Jeferson. Organizadores. Faces da tradição Afro-Brasileira: Religiosidade, Sincretismo, Anti-Sincretismo,Reafricanização,Práticas Terapêuticas,Etnobotânica e Comida.Rio de Janeiro: Pallas ; Salvador, BA: CEAO, 1999.
CASCUDO, Luis da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 11ed. São Paulo: Global 2001.
______. História da Alimentação no Brasil. 3 ed. São Paulo: Global, 2004.

CASHMOR, Ellis.  Dicionário de Relações Étnicas e Raciais – São Paulo.
Ed. Selo Negro. 2000.
CASTRO, Yeda Pessoa de. Falares africanos na Bahia: um vocabulário Afrobrasileiro. 1. ed. Rio de Janeiro: Topbooks Ed., 2001.
FERRAZ, Isa Grinspum. O povo brasileiro: Brasil crioulo (fita de vídeo - VHS). São Paulo: Idealização e Realização Instituto Itaú Cultural, s.d.FERREIRA, Ricardo Franklin. Afrodescendente: uma identidade em construção. São Paulo: Edusp, 2000.
FONSECA, Regina M. O povo brasileiro (fita de vídeo - VHS). São Paulo: Idealização e Realização Instituto Itaú Cultural, s.d.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande & Senzala: a formação da brasileira sob o regime patriarcal. 47. Ed. São Paulo: Global Editora, 2003.
GASPAR. Eneida, D. Guia de religiões populares do Brasil. 1 reimpressão. Rio de Janeiro: 2004
GAUDITANO, Rosa & TIRAPELI. Festas de fé.São Paulo, Metalivros, 2003.
GILROY, Paul. O atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34. Rio de Janeiro: Universidade Candido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2001.
HAMPÂTÉ BÂ, Amadou. Amkoullel, o menino Fula. São Paulo: Pallas Athena: Casa das Áfricas, 2003.
HOLLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1936.
HUG, Alfons (coord.) Arte da África. Obras-primas do Museu Etnológico de Berlim. Centro Cultural Banco do Brasil, 2003.
JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 2001.
JUNIOR, Vilson Caetano de Souza – O banquete sagrado: notas sobre os “de comer” em terreiros de Candomblé. Salvador, Bahia. Atalho, 2009.
KI-ZERBO, J (coord.). História Geral da África. Metodologia e pré-história da África. São Paulo: Ática; Unesco, 1982. Vol. 1
LODY, Raul. Santo também come. 2. ed. Rio de Janeiro: Pallas, 1998.
LODY, Raul.Dicionário de Arte Sacra e Técnicas Afro-Brasileiras.Rio de Janeiro. Pallas, 2003.
M´BOKOLO, Elikia. África Negra. História e Civilizações. Salvador: EDUFBA; São Paulo: Casa das Áfricas, 2009. Tomo 1 ( até o século XVIII)
MAGGIE, Yvone; REZENDE, Claúdia Barcellos (Org.). Raça como retórica: a construção da diferença. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
MEYER, Laure. Objectos africanos. Vida quotidiana, ritos, artes de corte. Lisboa: Livros e Livros, 2001.
MOURA, Clóvis. Os quilombos e a rebelião negra. Coleção tudo é história. vol.12. 4 ed. Ed. Brasiliense.1985.
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos orixás. Companhia das Letras. São Paulo. 2001
QUERINO, Manuel. Costumes africanos no Brasil. 2 ed. – Recife: FUNDAJ, Editora Massangana, FUNARTE, 1988.
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SILVA, Vagner Gonçalves da. Candomblé e Umbanda: caminhos da devoção brasileira. 2 ed. São Paulo: Selo Negro, 2005.
SODRÉ, Muniz. Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis (RJ): Vozes, 1999.
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